segunda-feira

Meus quatro pais

Foi o quarto pai que perdi. Quase 30 anos, quatro pais e quatro despedidas. Primeiro meu pai biológico, que demorou dez anos pra me conhecer. Foi uma perda ali, mesmo que hoje eu conviva com ele. Então nesse tempo meu pai foi meu avô, pra quem eu dava todos presentes de Dia dos Pais, aqueles feitos na escola com lenços e prendedores de roupa. Ele guardou todos, absolutamente todos. Encontrei eles no dia que disse adeus pro meu vô.

Depois veio o Pedro, um amigo da minha mãe. Por um acaso da vida, um dia ele me quis como filho e eu o quis como pai. Amor de graça. Inclusive documentamos essa “adoção” numa carta que tenho guardada até hoje, junto todas essas coisinhas queridas que a gente vai arrecadando pela vida.

Quando o Pedro morreu achei que nunca mais fosse ter pai. Até que minha mãe casou com o Valter, uma das melhores pessoas que já conheci. Ele me quis como filho rapidamente, talvez pelo tamanho do coração e pelo prazer que tinha em viver. Eu fui mais resistente, por medo de perder mais uma vez. Mas depois nós nos divertíamos quando ele me apresentava como filho e eu o apresentava como pai, já que ele era negro e eu loiro. A cara de COMO ASSIM das pessoas sempre nos fazia rir. Aliás, ríamos de muitas coisas juntos. E hoje eu olhei pela última vez pra ele. Dessa vez, sem rir.

E claro que valeu a pena, mesmo que por pouco tempo e mesmo sentindo esse aperto mais uma vez. Porque a dor é a mesma, em todas as vezes. O que muda é que vamos ficando mais calejados pra sair da dor e recolher os caquinhos. E também pra saber que, por incrível que pareça, a morte não é a pior coisa que existe.

Hoje me despedi do Valter. E fortunadamente deu tempo de agradecê-lo por tudo. Por ter sido meu pai, meu amigo e por ter ajudado, de várias formas, a realizar os meus sonhos. Agradeci por ter me dado tanto e por ter sido tanto. E disse que o amava. Aprendi a sempre me despedir de quem eu amo dizendo isso. Até porque eu não sei se vou ter outra oportunidade de dizer eu te amo. Essa é a merda da vida, as despedidas. É uma dor gelada. E mesmo que essa dor seja pequena diante de tudo aquilo que se viveu – e de fato é -, continua sendo uma merda. A maior e a mais dolorida das merdas.

Mas estaria sendo muito mais dolorida se não fosse por tanta gente querida que ajudou, apoiou, ouviu, segurou a mão e doou o sangue. Se existe um lado bom nessa merda toda, é isso. Então muito, muito obrigado mesmo.

E a partir de agora meu pai sou eu mesmo. Afinal eu tenho um pouco desses meus pais em mim. E a eles toda a minha gratidão, a minha admiração e a minha saudade.