quarta-feira

Depois dos 30

Então ontem eu bebi. Bebi pra caralho. Bebi champagne, muito. Champagne do bom, do ótimo, numa quantidade cavalar pros meus padrões atuais. Foi meu primeiro porre depois dos 30 (ainda se diz porre ou já inventaram outra gíria?). E hoje tá sendo minha primeira ressaca depois dos 30. Comprovei que depois dos 30 não temos ressaca, nós ficamos doentes.

E rapaz, essa ressaca é muito diferente daquelas que eu tinha com vinte e poucos. Se NAQUELE TEMPO eu podia passar a noite inteira bebendo, passar em casa só pra um banho e depois trabalhar habilmente o dia inteiro, hoje eu não sei como cheguei no trabalho. Não sei mesmo, não lembro. Única coisa do trajeto que eu lembro foi da padaria que entrei pra comprar uma água tônica, quando a caixa olhou pra minha cara e falou “Coca-Cola também é bom pra ressaca”. Na hora não entendi a imediata associação que ela fez da água tônica com a ressaca, até eu entrar no elevador e me olhar no espelho. Inclusive, eu se fosse a caixa da padaria, teria tentado me empurrar um chocolatinho.

Aliás, com 30 anos o dia da ressaca não traz só aquela sensação de ebola no corpo, ele traz também um resfriado por ter ficado sentado de cueca no chão do banheiro abraçando o vaso. Além de dor nas costas e nos joelhos. Eu tô o pó.

Não é só a ressaca que é diferente aos 30, o ato todo de passar mal também é. Com vinte e poucos, o meu passar mal era umas duas idas ao banheiro e aquela promessa babaca de “nunca mais vou beber”, mas tudo controlado. Ontem eu contabilizei umas 5 idas ao banheiro, o juramento em alto e bom som de nunca mais beber e a sensação que a morte tava parada ali na porta do banheiro esperando eu acabar.

Mas quem realmente tava no banheiro comigo era o Thomás, meu gato. Uma das poucas coisas que lembro de ontem era eu gritando SAI DAQUIIIIIIIII, TU NÃO PRECISA VER ISSO. Mas o Thomás ficou comigo todas as vezes que fui no banheiro e depois voltava pro quarto comigo. Hoje acordei com ele sentado na cama me olhando. Não sei se tava cuidando de mim ou envergonhado por mim, mas abracei ele, agradeci a companhia e dei o dobro de ração. E depois dizem que gato não é companheiro.

O único lado bom do porre/ressaca pós 30: minha casa tá impecável. Acho que o último resquício de sanidade que eu tinha ontem me disse NÃO BAGUNÇA NADA, NÃO SUJA NADA, É TU QUE VAI TER QUE LIMPAR DEPOIS, TE CONTROLA.

É isso amiguinhos, vou ali morrer mais um pouco. Deixo um conselho final: se você tiver menos de 30 anos, aproveite bebendo muito e coma seus vegetais. Se tiver mais, aproveite bebendo moderadamente, coma seus vegetais, não sente no chão frio do banheiro só de cueca, não fique ajoelhado enquanto vomita, mantenha a calma, respire fundo, cuide as suas costas, não grite com seu gato e preferencialmente beba quando você possa ficar o dia seguinte inteiro em coma.

Sobre empatia

Pra quem não tá entendendo essa consternação toda a respeito da morte do Eduardo Campos, eu explico: o nome disso é compaixão. E não existe compaixão seletiva. A consternação acontece pela tragédia de hoje, pelo massacre covarde na Faixa de Gaza ou pelo mendigo que morreu de frio, anônimo e sozinho nas escadarias de um banco.

A compaixão deveria ser obrigatória, mas não é. O que vi e li hoje foi uma parcela grande da população sendo idiota e mendigando atenção e popularidade da maneira mais esdrúxula possível: fazendo piada sobre uma perda. Quem morreu hoje não foi um político, não foi o candidato a presidência, foi o pai de 5 filhos. Pai, sabem? Pai, de que a gente sente saudade e, se tivermos sorte, podemos fazer essa saudade sumir com um abraço.

E enquanto 5 crianças perdiam o pai, milhares de pessoas faziam piada disso ou desejavam que outra pessoa tivesse morrido no lugar. Outra pessoa também com família, sentimentos e história, seja ela PT ou PSDB. Uma pessoa com um passado, um acumulado de pequenos traumas, vitórias, sorrisos e medos. Assim como eu ou você ou a Dilma ou o Aécio ou o Eduardo ou o seu pai. Mostrar compaixão pelos mortos da guerra e desdenhar de um político morto é ignóbil, é nefasto e é preconceituoso. Não tem diferença, todos deixaram um coração de luto.

Falta compaixão e também falta empatia nesse mundo desgraçado. Pra quem acha que uma piada não faz diferença, é só pensar “se alguém que eu amo tivesse morrido num acidente de avião e milhares de pessoas ficassem fazendo piada disso, como eu me sentiria?”. É difícil? Infelizmente parece que é. A imensa dificuldade que as pessoas têm em se colocarem no lugar das outras é, na minha opinião, o que faz desse mundo cada dia mais insuportável e dolorido.

Se o que aconteceu hoje tem um lado positivo, foi pra me mostrar quem eu quero e quem eu não quero no meu círculo de relações (ainda bem que a grande maioria também repudiou tudo isso que falei). E serviu também pra desejar, mais do que nunca, que a próxima geração tenha mais empatia e compaixão do que a nossa. Porque, do contrário, não vai sobrar mais nada.